segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Serviço Social - génese, emergência e institucionalização



Breve olhar sobre o contexto em que surge o serviço social

O Serviço Social tem, na sua origem, a marca profunda do capitalismo.


Até finais do Séc. XIX, a prática da assistência era, somente, uma expressão pessoal de caridade ou um eventual produto de uma motivação religiosa mas, com a criação da Sociedade de Organização da Caridade, pretendeu-se manter a distância destas práticas feudais e pré-capitalistas e apresentar uma nova abordagem da “questão social”. A sua principal intenção era marcar de forma inconfundível a acção dos filantropos ou reformadores sociais.

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Na França, a Revolução de 24 de Fevereiro de 1848, que originou a Proclamação da República Francesa, e a manifestação em massa da classe trabalhadora nas ruas, no dia 23 de Junho de1848, fazem emergir as condições para o aparecimento do serviço social, sob o impacto da Revolução Industrial.


A conjuntura histórica mundial, marcada por crises internas e por conflitos políticos, originavam tensões sociais. O proletariado andava contrariado com a classe Burguesa devido aos baixos salários e às precárias condições em que trabalhavam. A Burguesia necessitava da mão conciliadora de profissionais com conhecimentos em relações humanas e sociais.
Devido a esta conjuntura, em que havia a necessidade de uma estratégia de controlo social, desde o inicio do Séc. XX, a prática da assistência caminhava em direcção à profissionalização. Tal facto deveu-se aos esforços da Sociedade de Organização da Caridade e ao empenho pessoal de
Mary Richmond.

A 1ª Grande Guerra aproximava-se assim como a Revolução Russa.
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A importância das escolas de Serviço Social

Mary Richmond, da Sociedade de Organização da Caridade de Baltimore, propôs a criação de escolas para o ensino de Filantropia Aplicada na Conferência Nacional de Caridade e Correcção, em Toronto, em 1897. Mary acreditava que só através do diagnóstico social se poderia efectuar o tratamento à situação em causa. Mas para se chegar ao diagnóstico social teriam de ser feitos inquéritos, daí a necessidade de se administrar formação especializada adequada aos agentes sociais voluntários. A ela se devem a organização e a regência dos primeiros cursos de Filantropia Aplicada.

A primeira Escola de Filantropia Aplicada surge em 1899, em Nova Iorque.
Foi de extrema importância para a sistematização, profissionalização e institucionalização do Serviço Social.



Aparecimento das Escolas na Europa



Na Holanda, mais propriamente em Amesterdão, é criada a primeira escola de Filantropia Aplicada, ainda no ano de 1899.

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Na Alemanha, em Berlim, a primeira escola é fundada em 1908.

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Na Inglaterra, é criada a primeira escola de Serviço Social também no ano de 1908, incorporada na Universidade de Birmingham.
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Na França, em Paris, criam-se mais duas escolas: uma em 1911, de orientação católica e outra em 1913, de orientação protestante.



Em Portugal, só em 1937, em Coimbra, é criada a segunda escola de Serviço Social, a Escola Normal de Serviço Social, hoje Instituto Superior de Serviço Social de Coimbra. Mas a institucionalização do Serviço Social Português ocorre, apenas, durante o período da Segunda Grande Guerra. Até esta altura o serviço social era visto apenas como mediador de conflitos, no quadro do desenvolvimento capitalista. A partir da 2ª Grande Guerra, criaram-se mais escolas, integraram-se os Assistentes Sociais nos serviços públicos e o Estado Novo adoptou uma nova postura na política social.

No final da 2ª Guerra Mundial encontravam-se a funcionar cerca de duzentas escolas espalhadas pela Europa, Estados Unidos e pela América Latina onde foram criadas a partir de 1925.

Factores que ditaram o aparecimento tardio do Serviço Social em Portugal


A partir da implantação do Liberalismo, o Estado manteve o controlo da Igreja numa tentativa da laicização da sociedade portuguesa. O Estado pretendia superar e substitur a religião em todas as dimensões: cultural, institucional e sociabilitária. O laicismo era defendido pelos grupos de livre-pensadores, pela maçonaria, pelos movimentos republicano, socialista e anarquista que lutam pela separação das Igrejas do Estado. Em 1911, após a Implantação da 1ª Republica, é decretada a separação do Estado das Igrejas.
Mas, no período da Ditadura Militar (1926-1933), é reconhecido, de novo, à Igreja, a liberdade de ensino religioso. Mais tarde, o Estado-Novo alia-se à Igreja , opondo-se ao processo de laicização e, consequentemente, virando costas a uma sociedade moderna, construída nos principios da racionalidade, do individualismo e da democracia que a República tinha tentado construir.
A génese, a emergência e a institucionalização do Serviço Social Português vai ser determinado pelas relações Estado-Igreja e da confluência destes dois processos de sentidos opostos: a Questão Social e a Questão Religiosa. É sob os valores da Igreja, da sua doutrina social, da Acção Católica Portuguesa e do Corporativismo que surge a institucionalização do Serviço Social Português, a criação de escolas, a formação nelas ministrada e a abertura do mercado de trabalho às Assistentes Sociais. Não nos podemos esquecer, em todo este processo, da situação das mulheres portuguesas, qual o seu protagonismo e os Movimentos de Mulheres Católicas e de Feministas.
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Até às últimas décadas, em Portugal, a formação em Serviço Social, não se preocupava em formar Assistentes Sociais investigadores, mas Assistentes Sociais interventores.
Nos Estados Unidos, Canadá e Brasil, entre outros, esta situação já foi alterada há algumas décadas mas, em Portugal, isso só aconteceu a partir dos meados dos anos 80 quando a licenciatura foi reconhecida e a investigação surgiu como uma componente integrante da formação.
A criação das Escolas de Serviço Social ocorreu ainda durante o regime salazarista, mas tudo o que se conhecia até ao 25 de Abril de 74, sobre a sua criação e qual a formação nelas conferida, era feito apenas por pessoas externas à profissão, como médicos e juristas, geralmente só homens, que acompanharam ou participaram na institucionalização do Serviço Social Português.
O primeiro curso de Mestrado em Serviço Social surge em 1987 e aqui dá-se uma estreita relação entre investigação académica e serviço social já que a história da profissão se constitui objecto de investigação.

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Muitos foram os avanços do Serviço Social desde a sua implantação até aos nossos dias. Influenciados pela conjuntura político-social em cada época distinta da história do nosso país e marcada ainda pela sua evolução nas outras partes do mundo. Para além de todos os benefícios, o Serviço Social veio contribuir, também, para a emancipação da condição social das mulheres portuguesas.


Conclusão:

Após reflexão, sobre todo o processo evolutivo do Serviço Social em Portugal e pelo mundo, desde a sua emergência, institucionalização e profissionalização, conclui-se que o espírito de ajuda ao próximo mantém-se como o cerne de todo este processo. O indivíduo, como centro do universo, seja qual o meio em que se encontre, é originador de toda esta caminhada. Estudar o meio em que se encontra é uma forma de entender quais as causas que motivam os problemas com que se debate. O homem é um animal social, logo as suas acções estendem-se a todos com os quais se relaciona e influenciam a comunidade a que pertence numa constante interacção com outras comunidades. O bem-estar dum povo refecte-se em todos os contextos: político, económico e social. O facto do Assistente Social ter consciência de que não poderia ter apenas um papel interventor mas, também, pesquisador, é reflexo de que se poderia melhorar as acções do AS quando munidos de material com real conexão com a realidade. O Serviço Social actual, não tem equiparação com as acções de caridade e de filantropia que lhe deram origem, já que detém um conjunto articulado de valores, teorias e práticas. A justiça social e os direitos humanos são os principais valores do SS. Para além disso, o exercício social tem metodologias, modelos e métodos que lhe são próprios; é institucinal e políticamente enquadrado. A finalidade do SS é actuar sobre os problemas sociais, a fim de manter uma situação, melhorá-la ou transformá-la.
Foi um longo processo mas, todos nós agentes de mudança, devemos orgulhar-nos da nossa profissão já que ela é fundamental no equilibrio dum país. Deve ser exercida de forma consciente e conhecedora porque é fonte de mudança e de bem-estar.
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Poema do Homem Só

Sós,
irremediavelmente sós,
como um astro perdido que arrefece.
Todos passam por nós
e ninguém nos conhece.

Os que passam e os que ficam.
Todos se desconhecem.
Os astros nada explicam:
Arrefecem

Nesta envolvente solidão compacta,
quer se grite ou não se grite,
nenhum dar-se de outro se refracta,
nehum ser nós se transmite.

Quem sente o meu sentimento
sou eu só, e mais ninguém.
Quem sofre o meu sofrimento
sou eu só, e mais ninguém.
Quem estremece este meu estremecimento
sou eu só, e mais ninguém.

Dão-se os lábios, dão-se os braços
dão-se os olhos, dão-se os dedos,
bocetas de mil segredos
dão-se em pasmados compassos;
dão-se as noites, e dão-se os dias,
dão-se aflitivas esmolas,
abrem-se e dão-se as corolas
breves das carnes macias;
dão-se os nervos, dá-se a vida,
dá-se o sangue gota a gota,
como uma braçada rota
dá-se tudo e nada fica.

Mas este íntimo secreto
que no silêncio concreto,
este oferecer-se de dentro
num esgotamento completo,
este ser-se sem disfarçe,
virgem de mal e de bem,
este dar-se, este entregar-se,
descobrir-se, e desflorar-se,
é nosso de mais ninguém.
(António Gedeão)



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