segunda-feira, 30 de maio de 2016

À minha Mãe, Tomázia, e às Mães da sua geração... "Nós com os olhos no infinito do universo, na esperança de uma ajuda dos santos e eles no meio de nós…"





O meu bem-haja (como dizíamos na minha infância quando alguém nos dava motivo para agradecer, fosse por actos ou por palavras recebidos) ao José Teodoro Prata, pelas palavras Belas, Grandes e Profundas sobre a minha querida Mãe Tomázia da Conceição... 



  Pelos meus Pais, por todos os Pais e por todos os Filhos...

Gente da nossa criação

Eu vivi na casa onde apanharam o Pistotira, antes do meu irmão Zé Maria lá morar. Na cozinha, havia um buraco na parede, ao lado do lume, que dava para a cozinha da tua tia Carlota. Quando precisávamos de alguma coisa, lume ou que uns tratassem dos filhos dos outros, era por lá que os dávamos. O buraco era pequeno, só lá cabia um bebé. A tua prima Celeste passou por lá muitas vezes, para a minha mulher tomar conta dela.
 Assim me contou o senhor Luís da Tomázia, há anos, quando o entrevistei a propósito da prisão do Pistotira. É curiosa esta expressão Luís da Tomázia, que ouvi desde criança, tratando-se este Luís de um homem com uma personalidade forte, num tempo em que as mulheres ainda riscavam pouco.
Tenho refletido muito sobre esta expressão, por isso a demora. Ele é o Luís Rodrigues, também Luís Prata e ainda o Luís da Tomázia. Mas o que tinha ela para tamanho reconhecimento social? Acho que era um coração enorme, onde todos cabíamos.
A senhora Tomázia fazia parte do meu mundo de criança, prima da minha mãe por afinidade. Nunca fomos muito próximos, talvez por eu ser arredio, mas sentia-se um clima de carinho sempre que nos saudávamos.
Era ao alambique do Chão da Bica que nós da Tapada, a minha mãe a minha tia Stela, íamos fazer a aguardente. Massa carregada em bacias, à cabeça, e depois longas horas noturnas de pouco trabalho e muita espera. A presença da senhora Tomázia era constante, nos intervalos dos seus afazeres domésticos. Às vezes aparecia-nos já noite dentro para uma conversa ou um conselho sobre a intensidade do fogo debaixo da caldeira e a temperatura da água no tanque.
As minhas irmãs eram muito amigas das filhas mais velhas dela, e praticamente da mesma idade. Num ano do final da minha infância, eu, a Eulália, o meu primo João e não sei se o Tó, fomos ajudar nos trabalhos outonais: vindima, apanha do feijão pequeno… Era um misto de trabalho e brincadeira, a de comer e ainda nos pagavam qualquer coisa. A senhora Tomázia recebia-nos na cozinha, a cada meio-dia. Lembro-me como se fosse hoje de um bacalhau com batatas e muito azeite. Ainda tenho o sabor na boca. Depois, à sobremesa, já na rua, a melancia que coubesse na barriga.
Nós com os olhos no infinito do universo, na esperança de uma ajuda dos santos e eles no meio de nós…

José Teodoro Prata

http://dosenxidros.blogspot.pt/ 

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