Mágoa...
Herman Hesse escreveu: “Alguns de nós pensam que aguentar nos faz fortes. Mas às vezes, é desistir.”
Estava embrulhada nos meus pensamentos, no silêncio e semi-penumbra do meu quarto, quando a palavra surgiu como vestida de luz, após uma situação menos boa da qual resultou este sentimento, que de início não identifiquei... Surgiu límpida como a luz que atravessa os furinhos da persiana... O meu coração estava envolto em mágoa...
Uma dor constante vestida de tristeza... Originada por palavras cruéis, difíceis de entender pela pessoa que sou e procuro ser. Já se passou um dia e uma noite de insónia mas a dor lancinante inicial misturada de incredulidade foi-se transformando nesta mágoa que entristece o coração e traz as lágrimas, de quando em vez, sem serem chamadas...
Hoje acho-te tão triste, Celeste!
E as palavras morrem na garganta porque elas não irão sair nunca... Nunca na vida!!!
Talvez se transformem em exemplos ou frases elucidativas... Talvez um dia dêem origem a um conselho de vida, quando solicitado! Talvez... Mas só depois do isolamento, do refletir bastante e de ter entendido o que despoletou tal situação. Só quando a mágoa se for embora e der lugar a mais um degrau subido no crescimento e no entendimento da Vida e dos Outros.
Quando o queixo se erguer ao de leve, novamente, e quando o sorriso habitar o meu rosto... Sim, porque o sorriso não é apenas o resultado de um trejeito dos lábios mas de toda a luz que ilumina um rosto, um ser...
A dor foi tão forte e torna-se tão triste porque as palavras foram proferidas por alguém por quem eu nutria um certo apreço... Tudo se perde no tempo basta que uma luz ilumine o que tanto trabalho dá a esconder... Apenas uma palavra reveladora E nunca mais nada será como antes...
O meu sentir poderia ser outro, totalmente diferente se...
Mas desenganem-se
Que aqui não entram
Não causam efeito
Não causam dano
São demasiado despidas
Para qualquer engano
(Celeste Rebordão)
A Coragem de Seres Só
A dor foi tão forte e torna-se tão triste porque as palavras foram proferidas por alguém por quem eu nutria um certo apreço... Tudo se perde no tempo basta que uma luz ilumine o que tanto trabalho dá a esconder... Apenas uma palavra reveladora E nunca mais nada será como antes...
O meu sentir poderia ser outro, totalmente diferente se...
Ei-las que chegam de pantufas
Como que envoltas em lãs
Palavras Obtusas
Palavras Vãs
Chegam em nuvem cinzenta
Tais abutres em bando
Rasgando
Como que envoltas em lãs
Palavras Obtusas
Palavras Vãs
Chegam em nuvem cinzenta
Tais abutres em bando
Rasgando
Triturando
Anunciando grande Tormenta
Almejam transformar
A beleza em feiura
A pureza em negrura
A simplicidade em subtileza
Das palavras castas
Almejam transformar
A beleza em feiura
A pureza em negrura
A simplicidade em subtileza
Das palavras castas
São Traidoras
Perversas
Perigosas
Maliciosas
Mas desenganem-se
Que aqui não entram
Não causam efeito
Não causam dano
São demasiado despidas
Para qualquer engano
(Celeste Rebordão)
A Coragem de Seres Só
Uma arma de triunfo te dei, sobre todas
as outras: a coragem de seres só; deixou de te afectar como argumento ou
força esmagadora a alheia opinião, as ligeiras correntes e os
redemoinhos do mar; rocha pequena, mas segura, sobre ti se hão-de
erguer, para que vençam a noite, as luzes salvadoras; não te prendem os
louvores dos que te querem aliado, nem as ameaças dos contrários;
traçaste a tua rota e hás-de segui-la até ao fim, sem que te desviem as
variadas pressões. Só e constante, mesmo em face do tempo; os anos que
rolam tu os consideras elemento de experiência; para os homens futuros
episódios sem valor; se eles te abaterem, só terão abatido o que há de
menos valioso; e contribuirão para que melhor se afirme o que puseste
como lição da tua vida; a muitos absorve o actual; mas a ti, que tens
como tua grande linha de cultura, e porventura tua alma, a posse das
largas perspectivas, a hora começando te vê firme e firme te abandona.
Nenhuma estóica rigidez neste teu porte; antes a compassada lentidão, a
facilidade maleável de bom ginasta; não é por amor da Humanidade que
hás-de perder as mais fundas qualidades de homem. Em tal espelho me
revejo, eu que tomei tua alma incerta e a guiei; e contemplo como doce
oferenda, como a mais bela visão que me poderias conceder, a clara manhã
que já de ti desponta e lentamente progredindo há-de acabar por embalar
o universo nos seus braços de luz.
Agostinho da Silva, in 'Considerações'
Há muito tempo, uma pessoa amiga enviou-me um texto da Margarida Rebelo Pinto sobre a mágoa...
"É uma palavra bonita, mágoa. Sabe a lágrimas silenciosas, a noites de insónia,
a manhãs de Domingo solitárias e sem sentido.
Está para lá da tristeza, da saudade, do desejo de lutar pelo que já se perdeu,
da raiva de não ter o que mais se queria, da pena de ter deixado fugir um grande amor,
por ser demasiado grande. Primeiro grita-se, barafusta-se, soluça-se em catadupas.
Depois, é o pós-guerra, a rendição, a entrega das armas e as sentenças de um tribunal
marcial interior, em que os juízes são a vida, e o réu, o que fizermos dela.
Limpam-se os destroços. Enterram-se os mortos, tratam-se dos feridos,
que são as nossas feridas, feitas de saudades, de desencontros, palavras infelizes
e frases insensatas, medos, frustrações e tudo o que não dissemos.
A mágoa chega então, quando o cansaço já não nos deixa sentir mais nada.
É silenciosa e matreira, instala-se sem darmos por ela, aloja-se no coração.
Mas o mundo nunca pára. Nada pára. A vida foge, os dias atropelam-se,
é preciso continuar a vivê-los, mesmo com dor.
Pelo menos a mágoa magoa, mas faz-nos sentir vivos."
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