sábado, 31 de agosto de 2024

Ao Sr. António "Cordel"


Recentemente, a minha netinha passa dias seguidos comigo e cada vez nos vamos conhecendo melhor. 

Até os nossos silêncios e suspiros...  


Quando estou mais tempo em silêncio  ela pergunta, "ó avó o que estás a pensar? Parece que estás triste."

Respondo-lhe que estou a pensar, a recordar, a refletir. Tento fazer-me entender a uma criança com uma dezena de anos.

Digo-lhe que um gesto, uma palavra, um objeto me trazem outros momentos passados que, por algum motivo, ficaram arrumadinhos numa gaveta.

Ela diz "Está bem avó " ...

Foi o caso de hoje. Qualquer coisa me lembrou do Sr. António Cordel. Talvez o recordar duma conversa em que referi que os meus pais tiveram durante quase toda a minha vida, após a minha infância, um estabelecimento comercial.

Falei que os clientes eram na sua maioria homens mas também as esposas que iam comprar fruta e queijos, beber um cafezinho, etc.

O papel destes clientes foi muito importante ao longo da minha vida porque nos protegiam, nos aconselhavam. Concluindo, eram uma extensão da mãe e do pai onde quer que estivessemos.

A naturalidade com que estabeleço amizade com homens ou mulheres vem de todo este são convívio que me " fizeram pessoa".


O SENHOR ANTÓNIO "CORDEL"

Estavamos a passar uma temporada na casa dos meus pais. O meu filho João teria uns 5 anos e eu no final da segunda gravidez. Era noite, véspera do Dia dos Reis, e o meu filho disse -me, "mãe queria ir à espera dos Reis". Respondi-lhe que estava muito cansada e ele ficou muito triste. O Sr. António ouviu a conversa e disse-lhe "anda que vamos os dois à espera dos Reis".

E agarrou--lhe a mãozinha e lá foram à espera dos Reis.

Este ato deixou-me imensamente surpreendida e tão grata. Tão grata!!!

O Sr. António já estava doente morrendo algum tempo depois.

É nestas coisas que penso querida netinha, quando o silêncio invade o nosso espaço de amor.



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